15 de dezembro de 2008

Consumo consciente no Brasil ainda é teoria

Quando se questiona sobre o aquecimento global, consumidores brasileiros respondem que se preocupam com as mudanças climáticas e com a responsabilidade da indústria de um modo geral. Entretanto, enquete realizada pela revista Ecossistema revela que, embora o número de consumidores conscientes esteja crescendo no Brasil, por enquanto, para a maioria, essa preocupação faz parte apenas da teoria.

Apesar das ondas de conscientização que se propagam pelo planeta, eventos como o Natal, por exemplo, dão conta de um movimento em contramão - populações começam a se aglomerar em shopping centers e áreas comerciais em metrópoles de todo o mundo, na busca febril por enfeites e presentes para familiares e amigos. As preocupações com o meio ambiente, sobretudo nesses momentos, ficam em segundo plano. É como se as estatísticas assustadoras sobre a ação nefasta do consumo alienado fossem guardadas temporariamente. Mas os relatórios não dormem: a Avaliação Ecossistêmica do Milênio (encomendada pelo Secretário Geral das Nações Unidas, Kofi Annan, em 2000) continua a alertar para os riscos dos atuais padrões de produção e consumo, que ameaçam uma série de benefícios que sucedem do bom funcionamento dos ecossistemas. Uma ameaça contundente a todos os seres vivos do planeta.

Nossa enquete, "Consumo Consciente: Prática ou Teoria?", realizada no início de novembro, com 30 consumidores de idades variadas, revela que apenas 13% deles procuram saber como são feitos os produtos consumidos. Desses, 67% deixariam de comprar um produto se soubessem que prejudica o meio ambiente. Para Alcides Leite, professor de economia da Trevisan Escola de Negócios, "a conscientização do consumidor brasileiro vem aumentando ao longo dos últimos anos; porém, ela ainda está muito distante dos padrões apresentados em países desenvolvidos. Essa evolução depende, fundamentalmente, da qualidade da educação oferecida no País. Somente através da educação é possível mudar o comportamento das pessoas", complementa Leite.


Segundo Patrícia Vance, professora do Programa de Administração de Varejo (PROVAR), da Fundação Instituto de Administração, a educação contribui para conscientizar as pessoas e despertar o interesse pelo tema. Mas, diz ela, é preciso pensar na educação de forma ampla, promovida pelo governo para todos, com o envolvimento também das empresas. "Além da educação, é fundamental que esses agentes - escola, empresa e governo - atuem alinhados com esses princípios, sinalizando e reforçando um comportamento exemplar. Mais do que isso: é bom lembrar que cabe aos pais dar o exemplo. Se eles adotarem comportamentos que indiquem um consumo responsável, compartilhando os valores com a família, os mesmos serão gradualmente incorporados pelos filhos".

Um segundo fator que dificulta o crescimento sustentável é o custo, muitas vezes mais alto, dos produtos considerados ecologicamente corretos. É quando o assunto toca no bolso do consumidor que se pode perceber claramente a diferença entre os valores e a prática. Embora 67% do público pesquisado tenha respondido que a etiqueta "verde" influencia na escolha de um produto, apenas 50% estaria disposto a pagar mais por ele. Boa parte da população abre mão de suas responsabilidades como consumidor e opta por produtos mais baratos, mesmo que poluam o planeta. "O consumidor brasileiro, em sua maioria, ainda não está disposto a pagar valores mais elevados por produtos ecológicos, salvo quando esse valor já está incorporado à marca, como é o caso de empresas como a Natura e O Boticário. No entanto, este comportamento não se aplica a outros varejos, como por exemplo, o supermercadista", explica Patrícia.

O maior desafio está em mudar velhos hábitos de consumo. O Natal é um bom momento para colocar em prática aquilo que funciona muito bem na teoria. Segundo a professora, é importante considerar alguns aspectos antes de efetuar uma compra. Ela recomenda que se comprem apenas os itens necessários; sejam priorizadas as empresas fornecedoras que demonstrem comportamento ético e sustentável; haja preocupação com o descarte das embalagens, encaminhando-as para reciclagem; evite-se a compra de produtos piratas.

Alcides Leite diz que é necessário que o cidadão entenda que o modelo consumista, comum nos países desenvolvidos, é inviável em escala mundial e que existe a necessidade de se reverem valores e hábitos de consumo em todo o mundo. "Existem muitos produtos que contribuem para o desenvolvimento sustentável de regiões mais pobres do país e que devem ser difundidos pelas cadeias varejistas; produtos que valorizam a cultura local e geram renda para a população da região. É necessário, portanto, conjugar a atividade comercial, típica de um país capitalista, com a preservação do meio-ambiente. Somente através da atividade econômica é possível preservar as riquezas naturais". Segundo ele, consumo e preservação ambiental devem caminhar juntos.

Há algum tempo deixou de ser novidade que nossas atividades estão esgotando a natureza de tal forma que a capacidade dos ecossistemas, de sustentar as gerações futuras, já é incerta. Parece evidente que a proteção do capital natural não pode mais ser vista de forma secundária. E desse ponto de vista, os Natais podem ganhar um aspecto estratégico, para além de sua magia: a disseminação da importância do consumo consciente entre parentes, amigos e conhecidos. Esse é, sem dúvida, o melhor presente que alguém pode oferecer à humanidade nos dias atuais.
* Foto Valéria Almeida

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